segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Destino



         Ele pegou o ‘seven boy’ e passou requeijão (bastante, porque uma vez aberto, o vidro precisa ser consumido em oito dias) colocou uma colher de chá de ‘cappuccino’ e meia de açúcar num copo com água quente. Mexeu. Mordeu o pão e sorveu com prazer o café.
        
         Ela acordou assustada. Sonhou novamente com seu ex. Era um pesadelo. Foi ao banheiro, percebeu que sua dor de cabeça do dia anterior ainda persistia. Lavou o rosto. Escovou os dentes. Todos já haviam saído para trabalhar. Na cozinha tomou um leite com ‘nescau’ e decidiu adiar a arrumação da casa para mais tarde. Deitou-se no sofá e com o controle remoto zapeou a tv de 42 polegadas recém comprada pelo pai.

         Ele acabou o café e pegou o telefone.

         Ela ouviu o telefone tocando e pensou: “a essa hora só pode ser o chato do Paulo. Não vou atender”.

         Ele esperou dez chamadas e desistiu.
         Ligou novamente uns dois minutos depois. Contou até quinze e desistiu novamente.

         Ela levantou do sofá e constatou no celular que a ligação era de um número que não batia com os dos telefones do Paulo. O telefone tocou novamente. O mesmo número. Ela havia ido ao banheiro e ao ouvi-lo por pura preguiça, não atendeu.

         Ele então foi até a garagem e pegou a bicicleta que quase nunca usava. Na carteira pegou o papelzinho com o endereço. Refletiu um instante sobre o melhor trajeto. Saiu pela calçada sem pressa. Sua bicicleta era uma ‘montain bike’ das velhas. A correia estava estralando, porém ele não tinha muita pressa de chegar.

         Não tinha nada que prestasse na tv e ela decidiu ir dormir novamente. Jogou-se na cama. Tirou o sutiã e a calça. Ficou só de calcinha e camiseta. A dor de cabeça em seguida melhorou um pouco.

         Vinte e dois minutos depois. Uns quarenta e cinco quarteirões de distancia percorridos sem muito esforço, lá estava ele chegando no endereço do papelzinho. Parou a bicicleta em frente ao portão de ferro. Olhou a casa imponente, tirou de um bolso o papelzinho e do outro uma carteira de mulher. Abriu-a e pegou os trinta e três reais que estavam dentro. Guardou o dinheiro no bolso e gritou o nome que estava escrito no papelzinho.

         Vanusa estava tentando se lembrar de seu primeiro namorado. Era uma maneira de passar o tempo.
         Lembrou e com os olhos fechados tentava se livrar da claridade do dia e reencontrar o sono. Estava quase dormindo quando ouviu seu nome sendo gritado. Era voz de homem e não era a do Paulo.

         Ele pensou o quanto era estúpido. Se o telefone tocou e ninguém atendeu podia ser que por algum motivo ela não estivesse em casa. Fez então aquilo a que se propôs. Jogou a carteira o mais próximo que pôde da porta.

         Ao abrir a porta ela viu pelas frestas do portão um rapaz na bicicleta e ao mesmo tempo algo cair a sua frente.
         Era a carteira que julgava estar no bolso da saia que usara na noite anterior. Sem pensar gritou:

         - Hein!

         “E agora. Aquela moça bonita apareceu. Vai ver, é a dona da carteira. A tal da Vanusa”.

         Ela primeiro abaixou e pegou a carteira e depois foi em sua direção.

         “Ele é bonito, sarado. Não tem cara de malandro. A bicicleta é velha, mas seu tênis é um ‘Mizuno’ novo”.

         Ele decidiu dizer algo:

         - Ontem no clube vi a carteira no chão e por coincidência uma “mina” conhecia você da foto da identidade. É sua né? Aí ela escreveu teu nome e endereço e eu vim...

         Ela notou que ele tinha aparelho nos dentes.

         Ele notou que ela estava sem sutiã e que seus seios eram sensacionais.

         Ela percebeu seu olhar e se deu conta de que havia se esquecido de pôr o sutiã; sentiu vergonha, mas se recompôs, perguntando:

         - Você veio me entregar a carteira?

         - Primeiro eu liguei... A garota sabia seu telefone também, só que...

         Ele olhou para as pernas de Vanusa e sentiu uma coisa estranha.

         - Só que ninguém atendeu.

         - Ah...

         Ela sentiu algo forte no olhar dele e percebeu que seus olhos eram verdes.

         Dando uma risadinha ela respondeu:
         - Eu não atendi porque achei que era meu ex-namorado.

         “Que bom, ela não tem um namorado”.

         - Meu nome é Luis... O seu eu já sei... É Vanusa, não é?

         Olhou para os olhos dela e um sorriso surgiu em sua boca.

         - Bom... o que eu tinha de fazer, eu fiz... Thiau.

         - Você tem meu telefone, me liga tá...

         O que ele ouviu era tão bom que não quis estragar. Saiu e quando estava no outro quarteirão olhou para trás e a viu acenando.

         Ela virou as costas e ele parou, dando meia volta.

         Ela pôs a mão na boca como se quisesse pegar suas palavras de volta. Quando ele virou, sem querer se viu acenando.
         Não acreditava no que havia feito. Deu bola daquele jeito para um desconhecido. Entrou na casa ainda sob um estranho efeito de entorpecência. Deitou no sofá com os olhos para o teto; pensamentos obscenos lhe vieram à cabeça.

         Ele parou novamente em frente ao portão. Tirou o dinheiro do bolso e chamou-a novamente.

         Ao ouvi-lo chamando ela foi até o espelho, penteou seus cabelos, colocou rapidamente o sutiã e correu até a porta.

         Dessa vez, ele deixou a bicicleta na calçada. Abriu o portão e foi até a porta. Assim que ela apareceu sem falar nada ele lhe entregou o dinheiro.

         Ela pegou o dinheiro e entendeu tudo.

         Ele virou as costas e se foi.

         Ela fechou a porta e os olhos.

         E os dois nunca mais se viram.



        
 “The Firm”

1 p/ 13:00 h
...vou chegar atrasado.

Adeus tempo ingrato
Aposentei o relógio!

Deus do céu
O que será de mim?

Já não olho o espelho
Por mais de 2 minutos.

Já não penso nela.
Ih!... Pensei!!!

Um selo – preciso de um selo
Vou enviar uma carta.

“o meu amor segue anexo.”

Engraçadinho


Deixei minha rebeldia de lado
Ei! Ouviu? Deixei a rebeldia
Com ple ta men te de lado
E fui dormir pelado...

Esqueci de fazer a barba
Mudei por completo o penteado
E ao te ver, já nem fico suado
Nem procuro sentir raiva.

Apenas sento ao seu lado no ônibus
De vez em quando suspiro:
Mmmfffffmmmmmmfffff

E durmo, sem falar um á
Você então finge que dorme
Para eu não acordar...

Curtinho


O poema
Sem ritmo
Que escrevi
Era para você

O poema
Que sinto nascer
Aqui
Era para ficar

Com o sentimento
Que nunca foi
Descrito.

Com o momento
Que nunca foi
Vivido.

Insônia


Ouço batidas em copos
sons intraduzíveis
Vozes infantis
De repente... uma voz adulta.
E uma outra voz... artificial
(algum brinquedo moderno)
“bate papo”...
alguém que pede silêncio
“as crianças foram dormir”
...mais conversa.

[Si lên cio]

Foram dormir...

Um gato mia.
E lá longe um cão late
Só agora, só agora ouço a minha geladeira e
o relógio de parede.
A caneta
e o meu pensamento.